Blogia
A FÁBRICA

Alfredo Ferreiro

La Voz de Galicia. Julho de 1999.

La Voz de Galicia. Julho de 1999. El rey de Tonga elige a un estadounidense como su bufón. Taufa'ahau Tupou IV, rey de Tonga, ha nombrado al californiano Jesse Dean Bogdonoff como bufón oficial, según el Tonga Chronicle, "por su visión sensata llena de alegría y de verdad impregnada de felicidad".

O que está a acontecer?

Dia das Letras Galegas: os irmáns do Norte
«No próximo 17 de Maio comemora-se o Dia das Letras Galegas. Por todas as razões, a Galiza está tão próxima de nós como os países e povos de língua portuguesa que estão mais próximos. E, como já em outra oportunidade se assinalou, gostariamos de lhe poder dar muito mais atenção e espaço. Assinalando aquela data, publicamos o texto que um dos mais destacados vultos da cultura da Galiza de hoje, Víctor F. Freixanes, escritor, editor e membro do Conselho da Cultura Galego, escreveu para o JL, e que de certo modo dá uma expressiva panorâmica, e faz um balanço, da sua literatura e de parte das suas artes. E publicámo-lo no original, pois nos pareceu desnecessário, e porventura inadecuado, “traduzi-lo” para português, o que só por si é significativo. Damos ainda a lume uma peça em que se dá notícia de algumas das edições recentes, entre nós, de livros de autores galegos».

Jornal de letras, artes e ideias, 11 de Maio de 2005.

Galegos em português
«A qualidade intrínseca das obras e a proximidade histórica, geográfica e cultural são aspectos que têm determinado a tradução e publicação de autores galegos em Portugal, como salientam os editores contactados pelo JL, apesar de a língua galega, que partilha com o português a mesma raiz linguística —o galaico-português— levantar alguns obstáculos.
[...] A Deriva é uma das editoras que, actualmente, publica mais escritores galegos. A sua filosofia editorial procura, de resto, divulgar “culturas e literaturas minoritárias”, como explica António Luís Catarino. O facto da Galiza ser “culturalmente vizinha” do Porto, onde a Deriva tem sede, é outro dos factores determinantes, reforça o editor. Não é, contudo, uma tarefa fácil. Por um lado, “o mercado está virado para os bestsellers e para a cultura anglo-saxónica, pelo que a Literatura Galega, ainda que de grande qualidade, não tem a projecção mediática que merece”. E por outro, “o Galego é uma língua falsa, pelo que se tem de ter muito cuidado com os tempos verbais e as expressões idiomáticas, até porque as duas línguas tiveram muito tempo separadas”, explica.»

Jornal de letras, artes e ideias, 11 de Maio de 2005.

Unha escritora galega
«A lingua de Nélida [Piñón] é a mesma que floreceu en Portugal, na Galicia do sur, e cruzou despois o océano. A mesma (con algunhas variantes) de varios miles de emigrantes anónimos que, cos seus pequenos fardos domésticos e a maleta chea de soños, abandonaron un día as aldeas de Cotobade, o Ribeiro [...] e buscaron alén do mar a vida que aquí lles faltaba...

La Voz de Galicia, Culturas, 16 de Abril de 2005.

ROMANCE DO POETA DESCAVALGADO

Sou poeta galego,
quer dizer poeta edificado
nas ruinas da Galiza,
certo alicerce abandonado
do espírito português.
Sou cavaleiro sem cavalo
e a santa estirpe que canto
é um prego fundo extirpado.

Sou poeta descavalgado,
ginete errante de futuro incerto
que alguns querem ver no passado,
e ilusos cavalgam um asno
a pensarem que é cavalo.
Sou cavaleiro sem cavalo
e a santa estirpe que canto
é um prego fundo extirpado.

Sou um sino sem badalo,
esqueci o meu destino
outrora coroado,
e certas rédeas me conduzem
a um ermo campo isolado.
Sou cavaleiro sem cavalo
e a santa estirpe que canto
é um prego fundo extirpado.

Mudam os tempos, não mudam as vontades
a tentarem ver-me sempre
poeta descavalgado,
mas há um cavalo alado que sonho
a pastar em território ilimitado.
Sou cavaleiro sem cavalo
e a santa estirpe que canto
é um prego fundo extirpado.

[A VIDA ETERNA: EPÍLOGO]

(Para o Mário, com profunda amizade, devolvendo-lhe o que é seu)

Serei explícito. Sei que as pessoas que me conhecem não irão acreditar no que vou dizer, mas eu sou de madeira e a minha vida é eterna. Não nasci de madeira, mas sou de madeira e morrerei de madeira. O meu percurso é rápido, mas eu sou de madeira. O meu ventre é cilíndrico, porque eu sou de madeira. As minhas viagens, escassas. Porque eu sou de madeira. E a minha vida, eterna. Sou um homem de diamante. Pois é minha a capacidade da reflexão. Minha, a potência da luz. Na minha face o burguês indolente derrete seu desejo de mudar. Tenho a liga dos sinos. Dos que anunciam a paz. A farinha tinge já os meus cabelos. Sou quem cruza o deserto e saúda os templos. Se existisse uma pessoa que soubesse compreender as minhas mãos, veria nelas o caminho certo da libertação. A mão aberta que é pulsão irreprimível de vida. Atrás da minha face de morto, assoma a visão palpitante do coração de deus. Porque, como tenho plagiado, eu sou a mão que rasga a roupa de deus. E quem lha rouba. Foi Gabriel quem me aconselhou no vestuário. O Velho da Montanha mostrou-me os meus intestinos e neles vi o meu caminho. Sei que desenharei cidades, sei que constuirei os malecões. Sei que caçarei nos cais o amor. Sei como são os lemes que irão florescer no meu cabelo. Sei quais são as palavras do rumo certo. Sei por que ainda me obstino em persistir na viagem. Sei muito bem qual a função dos sapos, qual, como mostrarei, a cartografia do deserto. Sei, enfim, por que esculpo o meu corpo, por que amplio os espaços do poema. A minha é a experiência de uma vida eterna, a exploração sistemática do vazio que sucumbe. O conhecimento telúrico do amor que nos funda. Isso que tem como nome canção. A vida eterna é o conhecimento exacto, a descrição minuciosa do que assinala o norte. Caminhar polo centro da rua com as roupas tiradas e alma de corço. A imaculada lentidão dos meus passos até ao centro da floresta onde a minha cabeça é um manancial que flui brutal polas ruas e as praças. Inunda a cidade. Licua os espaços. Cria a revolução. Nadam os revolucionários. E os corpos saltam como sapos gozosos. E os homens ocupam o lugar dos sapos, depois do beijo. E Baal ri enquanto perde o tempo com Vénus na biblioteca. Nos olhos do Velho da Montanha eu vi a minha origem. E eu, em silêncio na minha cadeira de pedra, estático e marismático, de madeira, ofereço estes versos poderosos de vida, estes ramos que falam da árvore que é a cidade, que é verdor entre o imundo fumo, que é uma casa, que é a pulsão de um corpo nascente, dos poros carregados de memória. E por isso ofereço hoje estes versos como demonstração incontestável da experiência de viver uma vida eterna. Cruzando o deserto, continuamente. Tendo cruzado o inferno, que é um jardim autoritário, que é o esquecimento da poesia.